“A saída para o Açu” sob competente análise crítica de – Arthur Soffiati.

13 de fevereiro de 2013

Desde que o complexo logístico industrial portuário do Açu (CLIPA) começou a ser implantado, as opiniões sobre ele vêm se definindo. No momento, identifico seis posturas acerca do empreendimento. Em primeiro lugar, estão aqueles que o consideram a mais alta expressão do progresso e do desenvolvimento para a região. Ele representa a redenção regional em termos econômicos e sociais. Trata-se de uma atitude ufanista que não admite qualquer consideração de ordem crítica.

Em seguida, identifico os indiferentes, sabedores da existência do CLIPA sem, contudo, se interessar em obter mais informações a seu respeito. Os indiferentes tendem a se alinhar com os ufanistas. Em terceiro lugar, estão aqueles que transformam o complexo em objeto de estudo. A estes, os impactos socioambientais só interessam como assunto de suas pesquisas para publicação e enriquecimento de currículo.

Em quarto lugar, estão os pesquisadores que se acercam dos “donos” do empreendimento a fim de obter financiamento para seus projetos pessoais ou acadêmicos. Os integrantes desse grupo concebem a Universidade como uma instituição prestadora de serviço para a economia de mercado. Eles se colocam à disposição dos empresários como consultores desprovidos de atitude crítica.

Do outro lado, estão os estudiosos que concebem a Universidade como espaço crítico. Eles compõem a quinta posição. Suas análises são excelentes, mas falta-lhes algum senso de realidade. Por fim, em sexto lugar, estão aqueles que não apenas tecem críticas, mas também deixam seu fortim acadêmico para engrossar, como militantes, as fileiras dos que estão sofrendo com as instalações do CLIPA, entre eles, os pescadores e os produtores rurais.

Se, por um lado, a EBX e o Estado, em suas três instâncias, têm uma estratégia definida, seus adversários ainda não, mesmo que ela seja inviável. A recente Ação Judicial do Ministério Público Federal e a atitude do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), visando punir empresas do grupo EBX pela salinização da água doce e de terras cultivadas no Açu, trouxeram à tona certa perplexidade entre os críticos acadêmicos e os ativistas.

Examinemos a atitude do INEA. O órgão aplicou multa no valor de R$ 1.300 milhão à OSX, responsável pela construção do estaleiro. Além de obrigá-la a executar dragagem em três pontos do canal do empreendimento, o INEA exigiu da empresa pagar os prejuízos causados a pescadores e agricultores com a salinização e ainda arcar com os custos de implantação e manutenção do Parque Estadual da Lagoa do Açu.

Primeiramente, a multa parece uma atitude mais simbólica que prática tomada pelo Estado do Rio de Janeiro com o fim de demonstrar sua independência em relação à EBX. Se o INEA licencia e fiscaliza, também pune, se for necessário. Afinal, o executivo Paulo Monteiro ironizou as análises da UENF, comprovando a salinização de águas e terras, ao declarar para a imprensa que a região da restinga é salina por natureza. Depois, o excesso de sal deveu-se ao transbordamento de uma vala de drenagem do aterro hidráulico que ninguém viu. Acontece que a OSX tem direito a recurso. No final, não é de se estranhar que a questão entre INEA e OSX seja apenas um ato teatral a ser esquecido.

Sobre a indenização aos pescadores e agricultores, vejo-a como escárnio: indenização a quem, logo em seguida, será expulso de suas terras por meios “legais”. Por fim, a destinação de recursos financeiros pela OSX para implantar e manter o Parque Estadual Lagoa do Açu foi objeto de um acordo entre governo do Rio de Janeiro e EBX antes mesmo da salinização. É que a informação não foi muito divulgada pelos meios de comunicação.

Voltando a todas as posturas diante do CLIPA, externo meu entendimento. O processo de salinização, a meu ver, é inerente à abertura do canal do estaleiro dentro da restinga e ao aterro hidráulico. Por várias vezes, escrevi que o complexo consiste em colocar o continente dentro do mar (a ilha de pedra a funcionar como atracadouro de navios) e o mar dentro do continente (as dependências do estaleiro, com um canal de 300 m de largura e 18 m de profundidade). Eu gostaria que os técnicos me explicassem como será contida a salinização das águas subterrâneas e do solo introduzindo água do mar por um largo e profundo canal e acumulando um descomunal volume de areia saturada de água salgada para a formação do aterro.

Os críticos da economia de mercado, eu entre eles, devem ponderar que vivemos num contexto capitalista ainda forte. Assim, não podemos lançar o empreendimento no mar. No entanto, podemos lutar para que ele se limite ao mineroduto, ao porto e a uma termelétrica. Nada de estaleiro, de distrito industrial e de corredor logístico. Precisamos de pareceres técnicos demonstrando que a restinga não suporta mais do que os empreendimentos pretendidos inicialmente. Só assim, agora, podemos pensar num estado de equilíbrio entre ambientalistas, pescadores, produtores rurais e a invasão da EBX.

Arthur Soffiati – é professor universitário, escritor e um dos mais respeitados críticos na área ambientalista.  






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