O estadista se diferencia do político comum, entre outras virtudes, por saber discernir a verdade da mentira e, mais ainda, o momento certo de pronunciar a primeira –ou, então, de se calar. Mesmo quando não mente, erra de forma grave ao falar verdades na hora errada e de modo irrefletido, com fez o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT).
O deslize foi cometido perante três centenas de empresários, em São Paulo, em resposta do ministro sobre a pena de morte. “Se fosse para cumprir muitos anos em uma prisão, em algumas prisões nossas, eu preferiria morrer.”
O ministro qualificou penitenciárias como medievais. Elas não possibilitariam “aquilo que é mais importante numa ação penal, que é a reinserção social daquele que foi colocado na situação de privação da sua liberdade”.
Cardozo tem razão, ao menos em parte. Em dezembro do ano passado, o país contava uma população carcerária de quase 515 mil pessoas (aí incluídos 43,3 mil em delegacias e 18,7 mil em regime aberto). Como a capacidade total não chegava a 307 mil pode-se dizer que a superpopulação era da ordem de 70%, ou 1,7 custodiado por vaga.
Pior, desse total, somente 109,4 mil (23%) têm algum tipo de trabalho, interno ou externo, referido eufemisticamente como “laborterapia”. Em linguagem clara, a maioria é de presos empilhados e desocupados em prisões caóticas e desumanas, disponíveis para recrutamento pelo crime organizado.
Cardozo teve ao menos o cuidado de não falar em recuperação, a platitude preferida de uma visão romântica das prisões, que na realidade não passam de instalações de segurança para manter indivíduos perigosos afastados do meio social. No mais, conseguiu soar incrivelmente inoportuno. A primeira associação óbvia é com a pena de prisão em regime fechado imposta pelo Supremo Tribunal Federal, um dia antes, ao correligionário José Dirceu, por chefiar o esquema do mensalão.
Um desavisado poderia concluir que o ministro se sentiu compelido a denunciar a desumanidade dos cárceres apenas porque alguns próceres do PT estão mais próximos deles –hipótese que reduziria o ministro a um militante tacanho.
Bem pior foi ouvir verdade tão incômoda de um ministro de Estado, e logo da Justiça, como se não tivesse nada a ver com isso. Ora, seu partido se encontra há quase uma década no governo federal.
A própria gestão de Cardozo, já no governo Dilma Rousseff, também claudica na matéria. Sua pasta tinha R$ 312,4 milhões para melhorar penitenciárias em 2012, mas usou só um quinto dessa verba. Seria melhor se o ministro falasse menos e fizesse mais a respeito das masmorras brasileiras.
Editorial – Folha de São Paulo -15/11
Mais presídios não resolverá o problema da criminalidade
Não vejo a resolução do problema da criminalidade no país, da forma que o judiciário e o governo tratam a questão em si, através de medidas paliativas. Na verdade, o país tem um sistema prisional que, além de nojento e desumano, é considerado também uma verdadeira escola para o crime, sem falar do Código Penal brasileiro que é ultrapassado. É revoltante ver pessoas que cometeram crimes de menor teor ofensivo, bem como até crime famélico (roubo de produto alimentício para matar a fome) serem condenadas e jogadas nos presídios juntamente com criminosos alta periculosidade, enquanto que políticos corruptos, que desviaram milhões de verba pública da saúde, educação e etc., permanecerem impunes. Fora as aberrações existentes com as chamadas ‘brechas’ na lei, que permitem um convite para a impunidade.
Entendo que o país necessita de uma política de segurança pública tão eficiente e justa, quanto de um judiciário em todas as instâncias, tipo “Operação Mãos Limpas”, além de um sistema prisional no qual haja projetos de caráter socioeducativos, ressocializadores, onde presos tenham que produzir para o seio social do qual eles vieram e praticaram algum tipo de crime; que não tenham somente comer, beber e dormir. Talvez o atual modelo implantado na Colômbia seja um bom exemplo para o Brasil seguir.
Diante do caos e da falência em que se encontra esse sistema prisional, considera-se que deveria ser imediatamente, transferido para a iniciativa privada ou que houvesse uma parceria para propiciar-lhe infraestrutura, o que desoneraria o Estado de ter que arcar com custos elevados cujos recursos já escassos, poderiam ser melhor aplicados no ensino público, que também se encontram à beira da falência.
Aí sim, serei a favor da redução da maioridade penal não para 16 anos, mas para os 11, visto que, de que adianta reduzir para os 16 anos, se há adolescente a partir dos 11 anos, envolvidos no submundo da criminalidade e cometendo assassinatos?
Se o problema da criminalidade, da violência, da corrupção e da impunidade, é considerado um problema de judiciário, então, o dia que no Brasil existir uma Educação de qualidade e com escola integral para que essa molecada não possa servir mais de escudo para traficantes e aliciadores do crime organizado, professores recebendo salários dignos e com formação de qualidade, sendo cobrados pelo seu ofício, controle de natalidade, famílias estruturadas e um governo que não pense em administrar o país lançando mão de politicas assistencialistas (para continuar no poder com o curral eleitoral), podemos ter a certeza de que não haverá necessidade de se gastar mais dinheiro na construção de novos presídios.
Nelzimar Lacerda – Jornalista