Após 11 meses fazendo parte da linha de frente no atendimento da Covid, atendendo muitos pacientes, posso comprovar o que costumo falar nas minhas consultas, aulas, palestras e entrevistas sobre cumprir as medidas de prevenção cientificamente comprovadas.
Não peguei a Covid e tomei a minha primeira dose da vacina com muita alegria e orgulho, acreditando sempre que a ciência nos permite viver mais e melhor, principalmente no que tange ao tratamento e à prevenção de doenças.Foi certamente muito gratificante poder orientar centenas de pessoas angustiadas pelo medo de uma evolução ruim. Me senti recebendo a munição adequada para continuar esta guerra, que ainda será muito longa, mesmo com o discreto programa de imunização tendo iniciado.
A guerra não é só contra o vírus, mas principalmente contra a desinformação, através da descontrolada infodemia, encabeçada por políticos sem capacitação técnica e, infelizmente, por profissionais de saúde que não entendem ou não se lembram do que aprenderam nos bancos das universidades. Uma evidência científica vem a partir de estudos controlados, randomizados e multicêntricos e não de experiências pessoais, seja na abordagem terapêutica, assim como na prevenção.
Como tenho dito, sou totalmente a favor do tratamento precoce, mas ainda não existe nenhuma medicação com comprovação científica na fase inicial da doença. Assim que trabalhos sérios e de metodologias adequadas forem publicados e referendados pelas sociedades afins, serei o primeiro a prescrever. Temos alguns trabalhos sobre a ivermectina, mas pouco consistentes. A nitazoxanida diminui a carga viral a partir do quinto dia, mas não interfere no desfecho da evolução.
A cloroquina, já com múltiplas evidências mundiais, não funciona. Estamos agora em alerta com estudos sobre o uso da colchicina, um antinflamatório muito usado na gota, mas ainda não publicado. Estou acompanhando cada publicação de peso sobre o assunto e muito esperançoso que em breve teremos opções terapêuticas. Soroterapia a partir de plasma de equinos é uma esperança a partir de pesquisa brasileira. Já não me estresso mais com palavras de oncologistas ou virologistas ou diversas áreas preconizando drogas milagrosas.
Apenas lamento. As inúmeras mensagens de opiniões no whatsapp ou publicações cheias de incorreções metodológicas só atrapalham, pois os reflexos virão à frente, como o aumento de mortes em UTI por bactérias multirresistentes, por exemplo, pelo uso indiscriminado de azitromicina, um antibiótico para infecções bacterianas, ou o uso de corticoide logo no início, podendo levar a muitos efeitos colaterais. Existem vários profissionais adeptos ao uso de medicações sem comprovação científica, se reportando ao curandeirismo ou à época da alquimia.
Apesar de não concordar, pode-se perceber que são profissionais que não se baseiam em ciência, e que usam uma dita experiência pessoal em seu sucesso e têm seu modelo próprio de acreditação.Apesar de entender a necessidade de respeitar o preceito da autonomia do médico, é de fundamental importância que haja ciência e concordância do paciente. Mas vejo pacientes relaxando nas medidas de prevenção pelo fato de estarem usando medicações protetoras. Isso é inaceitável.Que a vacina chegue logo nos braços de todos os brasileiros para virarmos esta página tão dolorosa de nossa história.
Nélio Artiles – médico e professor